Realizou-se nos dias 10 e 11 de Dezembro na Universidade dos
Açores o IV Fórum de apoio á decisão (?) “Conhecer o mar dos Açores”.
Estive no segundo dia e com aquele lema do apoio á decisão
esperava que todos tivessem voz desde a minoria que efectivamente teve isto é
os representantes do Governo e dos interesses económicos até aos representantes
da pesca profissional e lúdica e dos simples utilizadores do mar.
Claro que os trabalhos científicos acho que todos ou quase
todos da Universidade dos Açores foram, como já nos habituaram, de muita
qualidade e interesse embora num caso com números de milhões de euros que até superavam o total das receitas da
Hotelaria nos Açores.
Mas no fim da parte que vi ficou Governo -2, Universidade -7
e privados comerciais -4.
Privados cidadãos -0, privados pesca lúdica -0 e pesca
profissional-0.
Acredito que tenham tentado a participação desta maioria dos
utilizadores do mar, que apenas teve uns vislumbres de intervenção (aliás muito
discordantes) nas perguntas da audiência mas não se viu nada mais apesar de a
Constituição Portuguesa estabelecer essa maioria como titular do direito ao uso
e fruição dos bens naturais públicos incluindo o mar.
Talvez porque ao contrário do que foi afirmado não há
consenso nenhum.
E o facto é que é no mínimo desonesto fixar áreas a proteger
incluindo algumas das poucas zonas das nossas costas escarpadas a que o cidadão
normal pode aceder pelos seus meios (sem barcos caros) e que são de utilização
tradicional pelos que asseguram parte da sua subsistência com a pesca.
Se agora já morrem todos os anos demasiados pescadores e
apanhadores de polvos e lapas imagine-se o que vai acontecer se lhes for vedada
a utilização de algumas das zonas de mais fácil acesso.
É muito mau misturar os interesses das empresas comerciais
de mergulho e observação com a necessidade que todos sentimos de criar zonas de
repovoamento para as espécies.
Enquanto os primeiros apenas querem tomar posse dos seus
locais de mergulho favoritos e reservá-los para os seus clientes, de
preferência estrangeiros que pagam melhor, a segunda pode ser realizada com um
mínimo de perdas para a maioria dos utilizadores do mar.
Por isso a proposta apresentada pelo conhecido e conhecedor
Nuno Sá para a zona do Faial/Pico me pareceu muito equilibrada ao dizer
claramente que gostaria de ter pequenas zonas protegidas á volta dos locais
tradicionais de mergulho em que seria bom não haver pesca e propondo uma zona
na Madalena que claro que vai acabar por ser a que os pescadores tradicionais
puderem aceitar.
A proposta da AAM apenas tenta ressuscitar o defunto decreto,
que entrou em vigor mas ninguém cumpria, aumentando o número de zonas para
reservar o máximo possível para o mergulho e a promiscuidade entre conservação
da natureza e dos recursos do mar e os operadores comerciais.
Basta ver que 8 das zonas propostas a única qualificação que
tem é incluírem em grandes extensões de costa pequenas zonas tradicionais de
mergulho que deveriam ser tratadas como tal e não misturadas com outros
objetivos mais consensuais.
E a maioria ou quase todas estão a menos de uma hora de
viagem dos barcos das empresas de Ponta Delgada e Vila Franca.
Porque a verdade é que, na minha modesta opinião pelo menos,
as zonas de reserva para repovoamento de espécies, podendo ser em qualquer
trecho da costa, devem ser fora do alcance, longe quanto possível de zonas
povoadas ou com acesso fácil ao mar, com inicio e fim bem visíveis do mar e de
terra (e claros para todos seja um farol ou uma falésia conhecida), com um bom
espaço de costa e mar entre elas e onde se diz claramente às pessoas “aqui não
se vai passar nada durante dez anos” ou coisa parecida.
E onde se podem tomar algumas medidas de apoio ao
repovoamento como é feito em muitos locais e note-se que há também muitos em
que até o mergulho é interdito.
Mergulhei por exemplo numa reserva no Brasil em que apenas
num cantinho é permitido o mergulho e sempre a mais de um metro do fundo.
Portanto eu se fosse de uma empresa de mergulho gostaria de
ter os locais preferidos o mais livres da pesca que fosse possível mas sem
exageros não vá alguém pensar em proibir o mergulho também ou reclamar isso em
tribunal.
E por exemplo se é verdade que a zona do Dori tem 800 m de raio
é uma perfeita estupidez (chegaria quase a terra e fomentaria a desobediência
permanente) mas como em muitas outras coisas da informação regional aos
cidadãos desafio alguém a encontrar o texto que instala aquela reserva.
E é fundamental que as reservas sejam aceites ou pelo menos toleradas
por todos.
Voltando ao Brasil uma tentativa desastrada já há algum
tempo de impor uma zona exclusiva para uma empresa de mergulho num banco de
pesca tradicional acabou com um incêndio de um barco e também ouvi falar de no
Pico ter sido retalhado á facada um pneumático de uma empresa de whale
watching.
Mas voltando ao Fórum de imposição das decisões ainda
tivemos um momento surrealista quando o DRAM interrompeu o evento para dar a
palavra a um representante de Santa Maria que nem estava inscrito como orador e
nos brindou com uma longa intervenção.
Note-se que tem todo o direito de defender as suas opiniões
e dos outros associados mas não daquela forma e naquele momento em que o Fórum
se transformou numa ante-visão do famoso Prós e Contras Açoriano que se iria
realizar ali ao lado também só com prós e sem contras.
Embora seja verdade que a regulamentação que saiu depois
para Santa Maria é equilibrada e minimalista como deve ser nas áreas e nas
restrições embora no limite da constitucionalidade nas duas linhas que dedica
aos privados.
Finalmente e para
deixar uma pequena contribuição de quem anda no mar há muitos anos acho que
deveria haver:
Transparência –
com a garantia de que quem legisla não tem interesses no que é legislado ou não
está capturado pelos agentes económicos
Audição – com a
garantia de participação de todos os interessados e com direitos de utilização
comum dos bens públicos no mar que só devem ser limitados no mais estrito
interesse geral
Informação – com
a garantia de que o que deve ser cumprido é claro e está á disposição de todos
para consulta em todos os canais de forma simples e preferencialmente
referenciado no local por marcas em terra e bóias no mar.
E Bom Ano Novo de 2015 para todos que gostam do mar com a
certeza que é possível a partilha sem ferir o nosso princípio constitucional da
igualdade.
João Paim Vieira
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