Fui ver o que era o anúncio da
“liberalização” da venda de peixe que saiu há dias em todos os jornais.
E afinal é apenas a liberdade dos
comerciantes de ganharem mais ainda.
Antes se compravam um peixe de um
quilo por dois euros só podiam ganhar meio euro ( alguém acreditará nisso?),agora
podem comprar o mesmo peixe por um euro e lucrar dois euros com ele.
E eu a julgar que era uma
liberalização a sério com o fim de um regime antigo , caduco e corrupto de
antes do 25 de Abril.
É estranho como muitas leis de
Salazar continuam a ser acarinhadas 40 anos depois do 25 de Abril e até se pede
para voltarem como no caso da incrível lei das rendas de casa.
Esta do peixe é no mínimo esquisita
- numa sociedade que se diz dos livres mercados e da concorrência os únicos que
se podem considerar produtores nesta área são impedidos de vender o seu produto
directamente aos consumidores finais.
Mesmo que se trate de muito pouco
peixe pescado por pequenos barcos artesanais de boca aberta.
Será que são eles próprios que
não querem?
Não foi o que vi este ano em
muitos portos pequenos e grandes dos Açores em que a generalidade dos
pescadores se pudesse vender directamente o faria.
São normas comunitárias – esta
venderam-me durante uns tempos mas em Abril em Marselha , capital europeia da
cultura, ao lado do Metro do Vieux Port
estavam umas bancas em frente a cada barco com grandes prateleiras de inox
cheias de peixe que moradores e turistas admiravam e compravam.
Pargos , sargos , meros ,
tainhas,bicudas,polvos ,lagostas , cavacos e tudo o mais muitos vivos e todos
com um ar de terem acabado de sair do mar.
E nem sequer muito mais caros que
nos Açores alguns até mais baratos.
Noutras cidades do sul para além da venda há uma espécie de
restaurantes em que cozinham o peixe que os turistas compraram aos pescadores.
Em Cabo Verde no
Tarrafal vimos a chegada de um barco de pesca artesanal que
entregou o peixe directamente para cestos de vendedores , particulares,
restaurantes ,hoteis etc.
Disseram-me que tinha um anotador do governo que marcava o
que ia saindo.
Ficando a mais valia em quem teve o trabalho , a dificuldade
e correu o risco de ir ao mar para disponibilizar o peixe que todos gostamos seja
bem fresco.
E criando postos de trabalho de valor acrescentado local.
Neste Verão vi muitos exemplos do contrário nos portos dos
Açores de Santa Maria às Flores.
Desde a Lagoa com os restaurantes á volta do porto onde
legalmente não entra peixe vindo do mar até Santa Cruz nas Flores mesmo que se
trate de vinte ou trinta quilos vai tudo para circuitos que deveriam ser
exclusivos da pesca em larga escala.
Claro que isso só estimula a fuga e o incumprimento .
Em Santo Amaro no Pico vi chegar um barco que trazia duas ou
três caixas de peixe e perguntei se dois meros de 4 ,5 kilos que trazia não iam
logo para os restaurantes locais.
Resposta : nem pensar ou tiram-me a licença e os subsídios.
E contudo o interesse público e local parecia ser que os
habitantes e os negócios dependentes dele pudessem comprar o peixe fresco ali
mesmo.
Ou os turistas irem ao restaurante almoçar um daqueles
meros.
Em vez disso o peixe foi para caixas com gelo numa
arrecadação no canto do portinho , ficou a aguardar até á tarde para ser levado
para a Madalena a 40 km de distancia, esperou pela manhã seguinte para ser
leiloado sem a presença do pescador( que diz que por aquela quantidade não lhe
vale a pena fazer 80 km) e correu o risco de ser vendido a um ou dois euros o
quilo(esta vendo pelo preço que comprei).
Se voltar a Santo Amaro aquele
peixe terá muito mais de 24 horas em cima e a mais valia dele já terá ficado
por outros lados e noutras mãos.
Uma das principais razões porque
Portugal está na situação em que está tem a ver com o excesso de regulação , de
leis e normas para tudo e para nada que na maior parte das vezes embora dizendo
defender o interesse público instalam interesses muito particulares.
Mas neste assunto não se fiquem
pela opinião de um curioso como eu perguntem como eu perguntei a quem sabe
mesmo a Liberato Fernandes que com a Porto de Abrigo mesmo no meio de muitos
problemas e dificuldades até substituiu o Estado numa função que era dele nas
comunicações com os pescadores e não só.
Ou ao nosso navegador Genuíno
Madruga que embora seja um pescador de grandes pescarias tem sensibilidade para
os problemas dos mais pequenos.
E arranjem um sistema mais justo
para os pescadores e que ponha o interesse público no acesso rápido e local aos
produtos do mar á frente de outros interesses.
João Paim Vieira
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