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domingo, 11 de janeiro de 2015

O Fórum do Mergulho

Realizou-se nos dias 10 e 11 de Dezembro na Universidade dos Açores o IV Fórum de apoio á decisão (?) “Conhecer o mar dos Açores”.

Estive no segundo dia e com aquele lema do apoio á decisão esperava que todos tivessem voz desde a minoria que efectivamente teve isto é os representantes do Governo e dos interesses económicos até aos representantes da pesca profissional e lúdica e dos simples utilizadores do mar.

Claro que os trabalhos científicos acho que todos ou quase todos da Universidade dos Açores foram, como já nos habituaram, de muita qualidade e interesse embora num caso com números de milhões de euros  que até superavam o total das receitas da Hotelaria nos Açores.

Mas no fim da parte que vi ficou Governo -2, Universidade -7 e privados comerciais -4.
Privados cidadãos -0, privados pesca lúdica -0 e pesca profissional-0.

Acredito que tenham tentado a participação desta maioria dos utilizadores do mar, que apenas teve uns vislumbres de intervenção (aliás muito discordantes) nas perguntas da audiência mas não se viu nada mais apesar de a Constituição Portuguesa estabelecer essa maioria como titular do direito ao uso e fruição dos bens naturais públicos incluindo o mar.

Talvez porque ao contrário do que foi afirmado não há consenso nenhum.

E o facto é que é no mínimo desonesto fixar áreas a proteger incluindo algumas das poucas zonas das nossas costas escarpadas a que o cidadão normal pode aceder pelos seus meios (sem barcos caros) e que são de utilização tradicional pelos que asseguram parte da sua subsistência com a pesca.

Se agora já morrem todos os anos demasiados pescadores e apanhadores de polvos e lapas imagine-se o que vai acontecer se lhes for vedada a utilização de algumas das zonas de mais fácil acesso.

É muito mau misturar os interesses das empresas comerciais de mergulho e observação com a necessidade que todos sentimos de criar zonas de repovoamento para as espécies.

Enquanto os primeiros apenas querem tomar posse dos seus locais de mergulho favoritos e reservá-los para os seus clientes, de preferência estrangeiros que pagam melhor, a segunda pode ser realizada com um mínimo de perdas para a maioria dos utilizadores do mar.

Por isso a proposta apresentada pelo conhecido e conhecedor Nuno Sá para a zona do Faial/Pico me pareceu muito equilibrada ao dizer claramente que gostaria de ter pequenas zonas protegidas á volta dos locais tradicionais de mergulho em que seria bom não haver pesca e propondo uma zona na Madalena que claro que vai acabar por ser a que os pescadores tradicionais puderem aceitar.

A proposta da AAM apenas tenta ressuscitar o defunto decreto, que entrou em vigor mas ninguém cumpria, aumentando o número de zonas para reservar o máximo possível para o mergulho e a promiscuidade entre conservação da natureza e dos recursos do mar e os operadores comerciais.

Basta ver que 8 das zonas propostas a única qualificação que tem é incluírem em grandes extensões de costa pequenas zonas tradicionais de mergulho que deveriam ser tratadas como tal e não misturadas com outros objetivos mais consensuais.

E a maioria ou quase todas estão a menos de uma hora de viagem dos barcos das empresas de Ponta Delgada e Vila Franca.

Porque a verdade é que, na minha modesta opinião pelo menos, as zonas de reserva para repovoamento de espécies, podendo ser em qualquer trecho da costa, devem ser fora do alcance, longe quanto possível de zonas povoadas ou com acesso fácil ao mar, com inicio e fim bem visíveis do mar e de terra (e claros para todos seja um farol ou uma falésia conhecida), com um bom espaço de costa e mar entre elas e onde se diz claramente às pessoas “aqui não se vai passar nada durante dez anos” ou coisa parecida.

E onde se podem tomar algumas medidas de apoio ao repovoamento como é feito em muitos locais e note-se que há também muitos em que até o mergulho é interdito.

Mergulhei por exemplo numa reserva no Brasil em que apenas num cantinho é permitido o mergulho e sempre a mais de um metro do fundo.

Portanto eu se fosse de uma empresa de mergulho gostaria de ter os locais preferidos o mais livres da pesca que fosse possível mas sem exageros não vá alguém pensar em proibir o mergulho também ou reclamar isso em tribunal.

E por exemplo se é verdade que a zona do Dori tem 800 m de raio é uma perfeita estupidez (chegaria quase a terra e fomentaria a desobediência permanente) mas como em muitas outras coisas da informação regional aos cidadãos desafio alguém a encontrar o texto que instala aquela reserva.

E é fundamental que as reservas sejam aceites ou pelo menos toleradas por todos.

Voltando ao Brasil uma tentativa desastrada já há algum tempo de impor uma zona exclusiva para uma empresa de mergulho num banco de pesca tradicional acabou com um incêndio de um barco e também ouvi falar de no Pico ter sido retalhado á facada um pneumático de uma empresa de whale watching.

Mas voltando ao Fórum de imposição das decisões ainda tivemos um momento surrealista quando o DRAM interrompeu o evento para dar a palavra a um representante de Santa Maria que nem estava inscrito como orador e nos brindou com uma longa intervenção.

Note-se que tem todo o direito de defender as suas opiniões e dos outros associados mas não daquela forma e naquele momento em que o Fórum se transformou numa ante-visão do famoso Prós e Contras Açoriano que se iria realizar ali ao lado também só com prós e sem contras.

Embora seja verdade que a regulamentação que saiu depois para Santa Maria é equilibrada e minimalista como deve ser nas áreas e nas restrições embora no limite da constitucionalidade nas duas linhas que dedica aos privados.

 Finalmente e para deixar uma pequena contribuição de quem anda no mar há muitos anos acho que deveria haver:

Transparência – com a garantia de que quem legisla não tem interesses no que é legislado ou não está capturado pelos agentes económicos

Audição – com a garantia de participação de todos os interessados e com direitos de utilização comum dos bens públicos no mar que só devem ser limitados no mais estrito interesse geral

Informação – com a garantia de que o que deve ser cumprido é claro e está á disposição de todos para consulta em todos os canais de forma simples e preferencialmente referenciado no local por marcas em terra e bóias no mar.

E Bom Ano Novo de 2015 para todos que gostam do mar com a certeza que é possível a partilha sem ferir o nosso princípio constitucional da igualdade.


João Paim Vieira 

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